quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Cristianismo Puro e Simples 6 - Duas Concepções de Deus

Pediram-me para falar sobre o que os Cristãos creem, mas quero começar falando sobre algo que eles não precisam crer. Cristãos não precisam crer que todas as demais religiões estão completamente erradas. Um ateu precisa crer isso, mas um cristão, não. Mesmo as religiões mais excêntricas contém ao menos alguma alusão a verdade. Contudo o cristão tem que admitir que no que difere o cristianismo das demais religiões, ele está certo e as demais religiões estão erradas. É como em aritmética: há somente uma resposta certa, mas há respostas erradas que mais se aproximam da certa do que outras.

A primeira grande divisão da humanidade nesse assunto portanto se encontra entre uma maioria que acredita em Deus (ou deuses) e uma minoria que não acredita. A segunda divisão se refere aos que creem, diferenciando-os a partir da espécie de Deus em que creem. Há duas idéias bem distintas nesse ponto. Uma é que Deus está além do bem e do mal, e os homens é que tem a tendência de categorizar as coisas como boas ou más. Mas que isso na verdade não passa de nosso ponto de vista, dizem também que quanto mais sábios ficamos mais conseguimos ver as coisas do ponto de vista divino e portanto menos distinção fazemos do bem e do mal. Assim seria verdade que um câncer é mal por matar um homem tanto quanto um cirurgião é mal por matar um câncer variando apenas o ponto de vista. Tal corrente de pensamento é conhecida como Panteísmo e foi defendida por Hegel e até onde eu sei também pelos hindus. A outra ideia é oposta e afirma que Deus é absolutamente bom e justo, um Deus que ama o que é amável e odeia o que é odioso e que quer que procedamos de uma certa maneira. Esta corrente é defendida pelos judeus, maometanos e cristãos.

Há outra grande diferença entre o Panteísmo e a ideia cristã de Deus. Os Panteístas acreditam que Deus, por assim dizer, impulsiona o universo como nós impulsionamos nossos corpos. Ou seja a relação de Deus e do universo é de mente e corpo e portanto se o universo deixasse de existir Deus também o deixaria. De acordo com tal pensamento toda a matéria deve ser considerada de alguma forma uma parte de Deus. O conceito cristão é completamente diferente. Cremos na relação Deus/universo como um pintor e seu quadro, ele tirou de sua cabeça a ideia do universo e a refletiu em seu quadro mas isso não quer dizer que o quadro ou a pintura em si sejam Deus ou partes dele, apenas refletem suas ideias. Essas duas diferenças se relacionam. É fácil dizer que tudo é Deus se você não faz distinção entre o bem e o mal, mas se você considera que algumas coisas sejam realmente ruins (como um câncer maligno) e considera que Deus seja totalmente bom, então não pode afirmar que ambos sejam um. O panteísmo diria que não enxergamos o panorama todo e que se enxergássemos veríamos que não há nada que seja apenas ruim, o cristianismo diz que Deus criou todas as coisas boas, mas que muitas delas foram corrompidas.

Isso gera uma pergunta óbvia, se Deus é bom e o mundo proveio dele, como puderam as coisas se corromper? Por muito tempo eu me neguei a ouvir o que Cristianismo tem a dizer sobre isso, acreditava que era apenas uma tentativa de contornar o óbvio, a simples verdade de que tal situação era absurda e portanto não havia Deus nenhum. Pois se um mundo é injusto não pode haver um Deus justo que o governe. O problema com meu pensamento é que não sabia explicar de onde havia tirado a ideia do que é justo e do que é injusto. Ninguém pode afirmar que uma linha é torta se não conhecer uma linha reta. Com o que eu comparava o universo ao qual eu chamava injusto? E mais, se ele fosse completamente injusto como eu, que sou parte do universo, reagiria contra ele, então estou agindo com justiça? Das duas a uma, ou me desfazia da ideia de justiça e injustiça reais, e passava a aceitar que não passava de uma opinião própria e pessoal (mas nesse caso meu argumento contra Deus sucumbiria visto que o universo poderia não ser de fato injusto, seria apenas aos meus olhos), ou aceitava que minha ideia de justiça fazia sentido e realmente vinha de algum lugar externo a mim mesmo e ao universo ao qual se deve considerar injusto. Portanto pra conhecer justiça e injustiça é preciso comparar o universo injusto a algo externo ao universo que seja justo e portanto faz sentido que haja um Deus justo mesmo havendo um universo injusto.

O ateísmo demanda crer num universo completamente injusto, mas se assim o fosse não teríamos conhecimento do que é justiça, e como isso não é verdade então argumentam que o universo na realidade não faz sentido. O ateísmo portanto torna-se por demais simplista afinal de contas se todo o universo não faz sentido algum, jamais descobriríamos que ele não tem sentido, da mesma forma que se não houvesse luz no universo jamais saberíamos o que é escuro, a palavra escuro perderia totalmente seu significado. É simplista portanto pois não encara os problemas, apenas os esconde sobre o fato de que jamais saberemos. E digo isso com convicção porque foi nisso que acreditei em grande parte da minha vida.

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