sábado, 4 de fevereiro de 2012

Cristianismo Puro e Simples 9 - O Arrependimento Perfeito

Como disse no capítulo anterior, ou Jesus era um louco, ou um demônio mentiroso, ou era o que dizia ser. Lendo os relatos sobre sua vida não posso acreditar que com toda sua sabedoria ele fosse louco, e também não acredito que ele era um demônio principalmente pela forma como a bíblia relata seus encontros com pessoas endemoninhadas. Então por mais assustador e improvável que pareça devo aceitar que ele era o próprio Deus em forma humana. Mas o que ele veio fazer aqui? Bom, certamente veio ensinar, mas não foi a única coisa que veio fazer, o novo testamento ou qualquer outro texto cristão fala constantemente de sua morte e ressurreição. Mais ainda, os cristãos creem que esse é o principal motivo de Deus ter se feito gente em Jesus.

A crença básica do cristianismo é que a morte de Cristo de alguma forma nos reconciliou com Deus e nos abre a possibilidade de uma nova perspectiva de vida. Existem diversas teorias cristãs que explicam essa morte, mas não são a mais pura essência da crença cristã. A principal teoria afirma que Cristo morreu porque Deus queria punir os humanos por terem escolhido se separar dEle e se unir ao grupo rebelde do inimigo, mas Cristo se ofereceu para ser punido em nosso lugar, e assim nos poupou. Mas o que quero ressaltar é que o que importa é a essência, e não as teorias que a explicam. Se alguém tem fome, se alimenta e fica bem, mesmo que não tenha nenhum conhecimento teórico de como se dá o processo que absorve os nutrientes dos alimentos, e mais, se algum dia tais teorias forem abandonadas, as pessoas continuarão comendo para combater a fome. Da mesma forma é com estudos de Física. Os cientistas explicam os átomos de forma a gerar em nossa mente uma imagem capaz de compreendê-los, mas eles não creem em tais imagens, eles creem em uma fórmula matemática. A representação mental é só para facilitar a compreensão, mas não é a verdade em si. Talvez você questione que bem faz acreditar em algo que não consegue entender. Bem como eu disse não é preciso entender o processo que leva o alimento a ser absorvido pelo corpo para se alimentar dele. Da mesma forma podemos crer que a morte de Jesus é algo que transforma toda a nossa vida mesmo antes de compreender o que ela é, ou o que ela representa. Aliás, só saberemos como ela opera em nossas vidas depois que aceitarmos e crermos que ela opera.

Portanto a essência é: Cristo morreu por nós, sua morte limpou nossos pecados e morrendo, ele venceu a própria morte. As teorias que explicam como a morte dele operou tais fatos são secundárias, e não devem ser confundidas com a essência, ainda assim é interessante conhecer tais teorias, pois assim como as imagens que os físicos fazem dos átomos, elas nos ajudam a compreender melhor o que aconteceu. A principal teoria é a que já afirmei, de que Cristo se voluntariou para sofrer o castigo que deveria ser nosso, e assim nos poupou. Mas penso que a princípio tal teoria lhe pareça tola, afinal se Deus tinha condições de nos poupar, porque não o fez desde o início? E porque punir um inocente no lugar do culpado faria diferença? Concordo que não faz sentido se estivermos pensando sob um ponto de vista policial, mas se pensarmos a partir de um ponto de vista de uma dívida, conseguimos entender que alguém com mais recursos possa pagar a dívida no lugar da pessoa que de fato deve. A pergunta que cabe ser feita agora então é que tipo de dívida o ser humano tem, de quanto estamos falando?

O homem tentou viver por conta própria, agir como se pertencesse a si mesmo. Em outras palavras o homem não é só um ser imperfeito que precisa se aperfeiçoar, ele é um rebelde que antes de mais nada precisa se render. O que o homem precisa fazer é pedir perdão, reconhecer que estava do lado errado, trilhando um mau caminho e se preparando pra recomeçar a vida do marco zero. Esse processo de entrega, esse movimento para trás a toda velocidade é o que o Cristão chama de arrependimento. Não confunda arrepender-se com desculpar-se. Arrependimento envolve que abandonemos uma postura de vida que temos desde que nascemos, é necessário "matar" uma parte de nós, em outras palavras para arrepender-se é preciso ser BOM. O problema é que só uma pessoa MÁ precisa se arrepender, mas só uma pessoa BOA é capaz de fazê-lo perfeitamente. Esse arrependimento perfeito é o que os cristãos chamam de conversão. E todo ser humano precisa passar por ela, embora uma parte deles se recuse.

O único jeito de passarmos por essa conversão, é com o auxílio de Deus, já que precisamos nos arrepender por sermos maus, e justamente por isso não somos capazes de nos arrepender. Deus nos auxilia colocando em nós um pouco de si, Ele põem sobre nós um pouco de seu raciocínio, e assim conseguimos pensar, põem sobre nós seu amor e assim conseguimos amar as outras pessoas. É como quando ensinamos uma criança a escrever. Ela segura o lápis e nós seguramos a mão dela, ela traça as letras porque nós as estamos traçando. Da mesma forma nós pensamos e amamos porque Deus está pensando e amando. Se não tivéssemos escolhido o lado rebelde, tudo isso seria fácil, mas agora dependemos completamente de Deus para fazer essas coisas. Precisamos principalmente do auxílio de Deus para fazer algo que em sua essência Deus não faz: voltar atrás, sofrer, submeter-se, morrer. Nada disso passa pela natureza de Deus, mas precisamos passar por isso e precisamos do auxílio dele, mas esse é um caminho que Deus em sua natureza nunca percorreu, Deus nos dá daquilo que tem, mas em sua natureza tais coisas não existem.

Mas antes que você se desespere, Deus já havia pensado em tudo isso, ele tinha a única resposta. Fundir sua natureza divina à uma natureza humana (capaz de sofrer e morrer), e então poder nos ajudar. Ele poderia sofrer e morrer por ser homem, e poderia fazer isso com perfeição por ser Deus. E é assim que Deus paga as nossas dívidas e sofre por nós o que Ele não precisaria sofrer de maneira nenhuma. A partir disso nossas tentativas de arrependimento só terão êxito se nós homens compartilharmos da morte de Deus que se fez homem.

Algumas pessoas criticam dizendo que a morte e o sofrimento de Jesus perderiam o valor se ele é de fato homem e de fato Deus, pois seria mais fácil para Ele. Na realidade, não eram apenas mais fáceis, a submissão, sofrimento e morte perfeitas só são possíveis por ele ser Homem e Deus. Mas não vejo nenhum motivo para não aceitar o que ele fez só porque lhe era possível fazer e não era a nós. Um professor ensina a criança pela mão a escrever porque é um adulto e já sabe escrever, se nos afogamos em um rio e há alguém na margem nos estendendo a mão diríamos "não posso aceitar sua ajuda, porque você tem uma vantagem"? Só podemos ser ajudados por alguém mais forte e que esteja em uma condição melhor do que a nossa. Não há motivo algum para se envergonhar disso, exceto o orgulho talvez. Mas alimentar o orgulho não passa de uma afirmação de que não queremos ajuda alguma, que podemos nos virar sozinhos, e foi justamente este pensamento que nos levou aonde estamos hoje, ao pecado, ao meio do rio profundo em que estamos prestes a nos afogar.

Mas como eu disse toda essa explicação é apenas uma teoria que explica a essência, não a confundamos com a essência em si, se a explicação não lhe ajudar então é melhor a deixar de lado. E se concentrar apenas na essência. Não deixe de se alimentar só porque não entende como os alimentos ingeridos acabam se tornando nutrientes absorvidos por seu corpo.

OBS MINHA (YURI): Não sei se tal teoria que C.S.Lewis explica realmente não faz parte da essência, ainda estou refletindo sobre o que ele quer dizer com isso e quais são as implicações práticas disso.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Cristianismo Puro e Simples 8 - A Alternativa Surpreendente

Bom concluímos o capítulo anterior afirmando então que os Cristãos acreditam que este mundo está dominado pelo inimigo. Mas isso gera uma pergunta, estaria isso de acordo com a vontade de Deus? Se sim, poderíamos dizer que ele é um Deus muito estranho; se não, como algo pode estar contra sua vontade? Se você já tomou um cargo de autoridade, tanto em sua casa quanto no trabalho ou outro lugar, sabe como é possível que algo esteja em parte de acordo com sua vontade, e em parte não. Por exemplo: Se você diz aos seus filhos que arrumem suas camas todos os dias por conta, sem você ter de ficar checando e mandando todos os dias e um dia você passa pelo quarto e vê as camas desarrumadas, isto está por um lado contra a sua vontade, mas por outro a liberdade dada aos filhos de arrumarem o quarto por conta própria está de acordo com sua vontade. Ou então pense que em uma instituição qualquer é só o trabalho passar a ser voluntário para metade das pessoas (pelo menos) deixar de trabalhar.

Deus criou seres com livre-arbítrio para escolher entre o bem e o mal, ele deseja que escolhamos o bem, mas acima desse desejo Ele quer que façamos nossa própria escolha. Ele considerou que era algo que valia a pena termos mesmo que escolhêssemos o mal, pois o nível da relação de amor que está destinada a um ser que responde em amor por escolha própria é inigualável. Não faria sentido algum criar seres feito máquinas que fossem obrigados a fazer o que foram programados, não valeria a pena. Deus sabia o que aconteceria se o ser humano escolhesse o mal, e estava disposto a pagar o preço por isso. Talvez fiquemos inclinados a discordar dele, mas como argumentar com alguém que criou a argumentação? Se Ele considera que valia a pena pagar o preço, só podemos concordar e agradecer.

Algumas pessoas perguntam: "Por que Deus fez o ser humano de um material tão fraco que se corrompeu?" Mas a corrupção nada tem a ver com a fragilidade do material. Quanto mais forte o material (a inteligência, a força, a liberdade) melhor ela será se proceder bem, OU pior será se proceder mal. Uma vaca não pode ser muito boa ou má, um cão já pode ser um pouco mais, uma criança mais, um homem adulto mais, um adulto extremamente inteligente ainda mais, e um espírito sobre humano seria ainda muito melhor ou pior dependendo de suas escolhas. Não podemos afirmar categoricamente mas podemos supor que o poder das trevas se desviou da seguinte forma. Quando se tem um eu autônomo, é possível que se queira se colocar acima de todos os demais, desejando ser o centro, o próprio Deus. É isso que se supõe ter passado pelo ser que se tornou o inimigo. Além de vivenciar isso, ele ainda ensinou tal coisa aos homens que também vivenciaram. Alguns acham que o pecado original tinha algo a ver com sexo, mas a Bíblia deixa claro que o sexo como as demais coisas era algo maravilhoso até ser corrompido, depois do pecado.

Enfim o que satanás queria que pensássemos é que podemos ser nosso próprio deus, que podemos ser independentes, e experimentar uma felicidade própria, fora de Deus, e é assim que começa a longa história humana na busca de algo sem ser Deus que o faça feliz como: dinheiro, ambição, guerra, prostituição, classes, impérios, escravidão, etc... Mas tais tentativas sempre falharão pois Deus nos fez como quem faz um motor movido a gasolina, não adianta tentar colocar outro combustível, pois o motor não vai funcionar como deveria, da mesma forma Ele nos fez para funcionarmos a partir do combustível "Deus", portanto só experimentando uma relação com ele é que vamos funcionar e seremos felizes. As vezes até dá a partida e anda alguns metros, mas logo quebra novamente.

Certo já sabemos o que o inimigo fez ao ser humano, mas então o que Deus fez quanto a isso? Bom, em primeiro lugar ele deu ao homem a capacidade de perceber o certo e o errado (Lei Moral), ninguém jamais conseguiu cumprir a lei completamente, mas continua sendo uma diretriz de Sua vontade. Em segundo enviou à terra algo que costumo chamar de bons sonhos: essas estranhas histórias em grande parte das religiões pagãs sobre um deus que se sacrifica e volta a vida dando aos homens uma vida nova. Em terceiro lugar ele escolheu um povo para se revelar e mostrar que tipo de Deus ele é: único e justo. Este povo foram os judeus, e o velho testamento bíblico dá uma boa noção de sua história. E por fim vem a principal atitude de Deus.
Surge entre os judeus um homem que se diz Deus, que atribui a sí o poder de perdoar os pecados e afirma que sempre existiu e que virá julgar o mundo no final dos tempos. Para panteístas e hindus não há nada demais em dizer que se é um com Deus, mas para um judeu, Deus é o totalmente outro, é um ser que está completamente fora do universo criado. Portanto o que este homem dizia era algo extraordinário.

Uma de suas reivindicações passa quase desapercebida, pois já a ouvimos tanto que perdemos a noção do que significa. Ele se diz capaz de perdoar qualquer pecado. Até entendemos a questão de EU perdoar alguém que procede errado contra MIM, ou de VOCÊ perdoar aquele que LHE ofende, mas como alguém pode perdoar o pecado de qualquer pessoa sem nem consultar aqueles que foram prejudicados pelo pecado, como se a parte mais interessada, mais prejudicada fosse ele mesmo? Isso só faria sentido se de fato fosse Deus e cada e qualquer pecado cometido fosse sua lei sendo quebrada e seu amor sendo ferido.

Apenas para concluir, sei também que existem alguns que afirmam a coisa mais tola possível a se dizer sobre Jesus: "Estou pronto para aceitar que Jesus foi um grande mestre de moral, mas não aceito a sua prerrogativa de ser Deus". Se Jesus fosse apenas um homem e dissesse o que Jesus disse, então não poderia ser um mestre de moral, ele seria ou um lunático em pé de igualdade com quem diz ser um ovo cozido, o que não o classificaria como mestre de coisa alguma; ou um demônio mentiroso o que também desqualifica-o de qualquer relação com questões morais. Ou era e de fato é quem diz ser, o Próprio Deus. Nossas alternativas portanto resumem-se a: contra-argumentar suas falas taxando-o de maluco; cuspir nele e matá-lo feito um demônio; ou cair aos seus pés e chamá-lo de Senhor e Deus. Mas em suas falas e em sua vida ele não nos deu nenhuma alternativa de considerá-lo um grande mestre de moral e nada além disso, não nos deu tal escolha e nem nunca pretendeu dar.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Cristianismo Puro e Simples 7 - A Invasão

Como disse no capítulo anterior, o Ateísmo é uma teoria muito simplista. Mas não é a única, outra posição muito simplista é algo que gosto de chamar de Cristianismo Água-com-Açúcar. Que afirma que há um Deus bom no céu, e que tudo está bem, deixando de lado todas as difíceis doutrinas sobre pecado, inferno, redenção, demônios, etc... Ambas são filosofias muito infantis. Não adianta procurar uma religião ou filosofia simplista, porque as coisas reais não são simples, por mais simples que uma mesa pareça, na verdade sua composição química, a resistência do material, o projeto matemático por trás, tudo isso é parte fundamental da mesa que você tem, o que a torna real é sua complexidade. Você pode parar nas aparências, mas se realmente está buscando a verdade então é bom que esteja preparado, pois ela não é simples.

Algumas pessoas que vão abertamente contra o cristianismo, só o fazem lidando com um cristianismo infantil, mas quando se tenta explicar o cristianismo como um adulto então reclamam que é complexo demais para se entender. E se Deus existisse ele teria feito a religião algo simples de se entender. Bom, primeiro que a religião não é criada por Deus, ele se faz revelar por fatos inalteráveis, o que nada tem a ver com religião, quanto a simplicidade, bem como eu disse acreditamos na realidade das coisas por serem complexas. Se os planetas em nossa galáxia tivessem a mesma distância entre si, ou um padrão quanto ao número de luas, acharíamos que algo foi manipulado, facilitado, falsificado. Mas o universo é tão complexo e sem sentido (padrão) que nos leva a crer que só pode ser real. A realidade é de fato bastante surpreendente e este é um dos motivos pelos quais eu creio no Cristianismo, jamais alguém pensaria em algo assim. Resumindo as perguntas não são simples, suas respostas também não serão, deixemos essas filosofias simplistas de lado para buscarmos a verdade, a realidade, mesmo que envolvida em sua complexidade.

A grande questão que ainda não respondemos é: O universo contém coisas obviamente más e aparentemente sem sentido, mas no meio disso tudo existem os seres humanos que sabem que tais coisas são más e/ou sem sentido. Só há dois pontos de vista que conseguem explicar isso. Um é o ponto de vista cristão, que diz que tudo era originalmente bom, de alguma forma o mundo foi corrompido mas ainda retemos na memória como as coisas deveriam ser. Outro ponto de vista é o que se chama Dualismo, que afirma que há dois poderes equivalentes e eternos por trás de todas as coisas e que travam uma guerra sem fim. O problema do dualismo é que diz-se que os dois poderes são independentes, nenhum criou o outro. Cada um pensa que o que faz é bom e o outro é ruim. Um gosta do amor e da misericórdia e o outro do ódio e da destruição. Mas o que queremos dizer então quando chamamos um de "o bom poder" e o outro de "o mal poder"? Imagino que só aja duas possibilidades. Ou estamos dizendo que preferimos um ao outro como quem prefere coca-cola à guaraná; ou achamos que um pensa que é bom, mas na verdade é ruim independentemente do que ache ou das escolhas que os seres humanos façam em determinados momentos. Se fosse a primeira opção então deveríamos parar de falar sobre bem e mal, pois na realidade não passariam de escolhas de acordo com nossa conveniência, e já vimos alguns capítulos atrás que a Lei Moral não depende de nossa conveniência. Então sobra a opção de que o mal poder está equivocado e de fato ele é injusto.

Mas aí cairíamos de novo na questão de que para algo ou alguém ser considerado justo ou injusto é necessário um terceiro poder a que se compare os dois e veja qual está de conformidade com ele (justo) e qual não (injusto). Outra forma de vermos isso é que se o dualismo fosse verdade o mal poder exime que há desejo de maldade pela maldade. Mas isso não existe. Ninguém é mal por ser. Por mais cruel que alguém seja sempre há o objetivo por algo bom (prazer, dinheiro, poder, segurança) mas de modo errado. A maldade não passa da bondade corrompida, só podemos explicar uma perversão sexual a partir de uma sexualidade normal. Explica-se o pervertido pelo normal e não o contrário. Logo para ser mau é necessário que se busque algo bom pelo modo errado, ou que se tenha algo bom para perverte, mas um poder absolutamente mal não poderia buscar algo bom ou ter algo bom em nenhuma hipótese, a não ser que lhe fosse dado tais coisas pelo bom poder, mas nesse caso os poderes não seriam equivalentes e independentes. Não passa de uma fantasia.

É por esse motivo que o Cristianismo defende que o demônio é um anjo caído, pois reconhecem que o mal não é algo original, mas um parasita disposto a corromper a bondade. Para um homem ser mau é preciso resolução, habilidade, boa aparência, inteligência, e a própria existência, e tais coisas são boas em si mesmo. Ninguém poderia existir simplesmente pela maldade, porque existir é algo bom em si mesmo. Eis porque, rigorosamente, o dualismo não convence. Mas não tire conclusões precipitadas, algumas coisas no cristianismo realmente se assemelham ao dualismo. o Cristianismo defende sim a existência de um poder das trevas e que há uma grande batalha entre esses poderes, a diferença é que crê-se que o poder das trevas foi criado por Deus, que era originalmente bom, mas corrompeu-se. Assim a guerra seria mais como uma guerra civil onde vivemos na parte do universo dominada pelos rebeldes.

"Um território ocupado pelo inimigo, eis o que este mundo é! O cristianismo é a história de como o rei justo desembarcou disfarçado e nos chama para participar de uma grande campanha de sabotagem. Quando vamos à igreja, escutamos o telégrafo secreto de nossos amigos: esta é a razão pela qual o inimigo está tão interessado em nos impedir de irmos à igreja. Ele faz isso jogando com nossa vaidade, preguiça e esnobismo intelectual." Talvez alguns perguntem se vou então introduzir a figura do diabo com patas, chifres e tudo mais. Não tenho predileção por patas e chifres, e não tenho interesse em conhecer sua aparência física, mas fora isso a resposta é sim. E mais afirmo que se alguém tem interesse em conhecê-lo não se preocupe ele se fará conhecer, mas se você ficará contente ao conhecê-lo, isso é um outro problema.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Cristianismo Puro e Simples 6 - Duas Concepções de Deus

Pediram-me para falar sobre o que os Cristãos creem, mas quero começar falando sobre algo que eles não precisam crer. Cristãos não precisam crer que todas as demais religiões estão completamente erradas. Um ateu precisa crer isso, mas um cristão, não. Mesmo as religiões mais excêntricas contém ao menos alguma alusão a verdade. Contudo o cristão tem que admitir que no que difere o cristianismo das demais religiões, ele está certo e as demais religiões estão erradas. É como em aritmética: há somente uma resposta certa, mas há respostas erradas que mais se aproximam da certa do que outras.

A primeira grande divisão da humanidade nesse assunto portanto se encontra entre uma maioria que acredita em Deus (ou deuses) e uma minoria que não acredita. A segunda divisão se refere aos que creem, diferenciando-os a partir da espécie de Deus em que creem. Há duas idéias bem distintas nesse ponto. Uma é que Deus está além do bem e do mal, e os homens é que tem a tendência de categorizar as coisas como boas ou más. Mas que isso na verdade não passa de nosso ponto de vista, dizem também que quanto mais sábios ficamos mais conseguimos ver as coisas do ponto de vista divino e portanto menos distinção fazemos do bem e do mal. Assim seria verdade que um câncer é mal por matar um homem tanto quanto um cirurgião é mal por matar um câncer variando apenas o ponto de vista. Tal corrente de pensamento é conhecida como Panteísmo e foi defendida por Hegel e até onde eu sei também pelos hindus. A outra ideia é oposta e afirma que Deus é absolutamente bom e justo, um Deus que ama o que é amável e odeia o que é odioso e que quer que procedamos de uma certa maneira. Esta corrente é defendida pelos judeus, maometanos e cristãos.

Há outra grande diferença entre o Panteísmo e a ideia cristã de Deus. Os Panteístas acreditam que Deus, por assim dizer, impulsiona o universo como nós impulsionamos nossos corpos. Ou seja a relação de Deus e do universo é de mente e corpo e portanto se o universo deixasse de existir Deus também o deixaria. De acordo com tal pensamento toda a matéria deve ser considerada de alguma forma uma parte de Deus. O conceito cristão é completamente diferente. Cremos na relação Deus/universo como um pintor e seu quadro, ele tirou de sua cabeça a ideia do universo e a refletiu em seu quadro mas isso não quer dizer que o quadro ou a pintura em si sejam Deus ou partes dele, apenas refletem suas ideias. Essas duas diferenças se relacionam. É fácil dizer que tudo é Deus se você não faz distinção entre o bem e o mal, mas se você considera que algumas coisas sejam realmente ruins (como um câncer maligno) e considera que Deus seja totalmente bom, então não pode afirmar que ambos sejam um. O panteísmo diria que não enxergamos o panorama todo e que se enxergássemos veríamos que não há nada que seja apenas ruim, o cristianismo diz que Deus criou todas as coisas boas, mas que muitas delas foram corrompidas.

Isso gera uma pergunta óbvia, se Deus é bom e o mundo proveio dele, como puderam as coisas se corromper? Por muito tempo eu me neguei a ouvir o que Cristianismo tem a dizer sobre isso, acreditava que era apenas uma tentativa de contornar o óbvio, a simples verdade de que tal situação era absurda e portanto não havia Deus nenhum. Pois se um mundo é injusto não pode haver um Deus justo que o governe. O problema com meu pensamento é que não sabia explicar de onde havia tirado a ideia do que é justo e do que é injusto. Ninguém pode afirmar que uma linha é torta se não conhecer uma linha reta. Com o que eu comparava o universo ao qual eu chamava injusto? E mais, se ele fosse completamente injusto como eu, que sou parte do universo, reagiria contra ele, então estou agindo com justiça? Das duas a uma, ou me desfazia da ideia de justiça e injustiça reais, e passava a aceitar que não passava de uma opinião própria e pessoal (mas nesse caso meu argumento contra Deus sucumbiria visto que o universo poderia não ser de fato injusto, seria apenas aos meus olhos), ou aceitava que minha ideia de justiça fazia sentido e realmente vinha de algum lugar externo a mim mesmo e ao universo ao qual se deve considerar injusto. Portanto pra conhecer justiça e injustiça é preciso comparar o universo injusto a algo externo ao universo que seja justo e portanto faz sentido que haja um Deus justo mesmo havendo um universo injusto.

O ateísmo demanda crer num universo completamente injusto, mas se assim o fosse não teríamos conhecimento do que é justiça, e como isso não é verdade então argumentam que o universo na realidade não faz sentido. O ateísmo portanto torna-se por demais simplista afinal de contas se todo o universo não faz sentido algum, jamais descobriríamos que ele não tem sentido, da mesma forma que se não houvesse luz no universo jamais saberíamos o que é escuro, a palavra escuro perderia totalmente seu significado. É simplista portanto pois não encara os problemas, apenas os esconde sobre o fato de que jamais saberemos. E digo isso com convicção porque foi nisso que acreditei em grande parte da minha vida.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Cristianismo Puro e Simples 5 - Temos Razão para estarmos Preocupados

Concluímos no capítulo anterior que na Lei Moral alguém ou alguma coisa, fora do universo material, realmente atua dentro de nós. Imagino que alguns leitores tenham ficado descontentes quando cheguei a esse ponto, e consideram que apesar de eu ter camuflado uma filosofia na verdade eu só estava enganando-os pregando um sermão religioso. E que de religião este mundo já está cheio e a considera algo ultrapassado.
Bem, a vocês quero dizer 3 coisas.

Primeiro; quanto a ser ultrapassado, poderíamos dizer por exemplo que muitas vezes é sensato ser ultrapassado por um louco dirigindo na estrada, o que importa é chegar em nosso destino e se nos apressarmos talvez não cheguemos lá por tomar algum caminho errado, inclusive, se já estiver em uma rota errada, o único jeito de progredir é dando meio volta e voltando à estrada correta, do contrário jamais se chegará ao objetivo. Nada há de progressista em teimar e não admitir o erro, e creio que olhando pra nossa sociedade, é óbvio que o ser humano cometeu um grave erro em algum ponto.

Segundo; não considero que minhas palavras até então estejam relacionadas a um sermão religioso, não falamos nada até aqui sobre o Deus de uma religião, muito menos especificamente o do cristianismo. Só sabemos que há alguém ou alguma coisa por trás da lei moral e não nos valemos até então da igreja ou da bíblia para tais conclusões, usamos exclusivamente nosso raciocínio lógico, e portanto até então nada mais é do que filosofia pura. Sabemos da existência desse "algo ou alguém" por dois motivos, um é o próprio universo que ele fez. Se tivéssemos apenas esta evidência concluiríamos que esse alguém é um artífice brilhante, pois o universo é lindo, mas também alguém muito cruel, pois o universo também é muito perigoso. No entanto temos outra evidência que inclusive é o que nos leva a crer que o universo não é materialista (matéria eterna e condução evolucionista ao acaso), que é o fato de que como seres humanos conhecemos a lei moral embora não a tenhamos criado e não a obedeçamos apesar de sabermos que devemos obedecê-la.

A partir dessa segunda evidência podemos concluir que esse ser é bom, não no sentido de piedoso ou misericordioso, mas no sentido de correto e justo. Pois afinal a lei moral que ele estende ao ser humano é sempre pautada por extrema justiça e altruísmo. Uma parte de nós concorda com ele que o egoísmo, a ganância, etc, devem ser punidos e reprimidos, mas queremos que em nosso caso sejam feitas exceções. No entanto se há uma retidão absoluta ela deve odiar a maior parte de tudo o que fazemos, e esse é o nosso dilema. Se o universo não fosse governado por uma retidão absoluta então não haveria motivos para não agirmos como bem entendemos e assim estupros, roubos e assassinatos não poderiam ser considerados errados. Mas se é governado por tal retidão, então a cada dia que passa nos tornamos mais inimigos deste ser absolutamente correto. Deus é o único apoio e o extremo terror, o que mais precisamos e de quem mais desejamos fugir. O único possível aliado e nós nos fazemos seus inimigos.

Terceiro; se escolhi uma rota indireta para chegar a tais conclusões não foi meu objetivo enganar ninguém, acontece que para entendermos o que o Cristianismo fala a respeito do universo é preciso primeiro chegar a tais conclusões, o centro da tese cristã se encontra no arrependimento humano e no perdão divino, mas como falar sobre isso com pessoas que não sabem o que fizeram de errado e portanto não entendem de que devem ser perdoadas? É preciso primeiro concluir a existência de uma lei moral e de que há um poder por trás dela para entendermos que apesar de sabermos que devemos fazer algo não o fazemos, e assim vamos contra este poder por trás da lei. Só agora que entendemos o quão desesperadora é a nossa situação é que temos algo a aprender com o cristianismo. Pois ele explica como caímos nessa situação, como Deus pode ser pessoal além de uma mente por trás da criação, como as exigências dessa lei que nenhum de nós cumpre completamente foram cumpridas em nosso lugar, como o próprio Deus se fez homem para salvar o homem da condenação de Deus.

Queria poder dizer coisas mais agradáveis, mas se formos honestos conosco sobre os pensamentos que adotei até aqui não podemos negar a nossa trágica situação. Não tenho dúvidas de que o cristianismo proporciona uma satisfação indizível, mas ele não começa pelo conforto e sim pelo desconforto que descrevi até aqui. E digo mais, não adianta procurar a satisfação sem antes passar pelo desconforto, satisfação não é algo que encontramos procurando por ela. Se procurarmos a verdade poderemos encontrar a satisfação no fim. Se procurarmos primeiro a satisfação, não a encontraremos e nem à verdade, encontraremos apenas adulação superficial e falsa esperança e por fim o desespero.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Cristianismo Puro e Simples 4 - O que há por trás da Lei


No capítulo anterior concluímos a existência de uma lei objetiva criada, mas não POR seres humanos, mas PARA eles. Mas o que isso nos diz a respeito do universo?

Existem duas correntes de pensamento sobre este assunto. Uma é Materialista (crê que a matéria é eterna), sem razão de existir, que comportando-se ao caso, gerou o universo, e a vida que evoluiu em uma série de improbabilidades num ambiente propício até se tornar seres racionais. A outra corrente, é a corrente Religiosa, que afirma haver algo por trás do universo que o criou e que se assemelha ao nosso ponto de vista mais com uma mente, do que com qualquer outra coisa que conheçamos. "Algo" com propósito e consciência, que possui preferências, escolhas. Segundo esta corrente o universo bem como o ser humano é criado com um propósito e estes seres humanos se assemelham com esta "mente" pelo fato de também possuírem mentes.

Nunca uma dessas correntes se extinguiu ou prevaleceu sobre a outra evoluindo e caminhando para o total extinguir da outra. Aonde houver pensadores, existirão as duas correntes. Além disso posso afirmar que pelo método científico é impossível provar qual delas está correta, isto pq tal método parte da experimentação e observação. Em qualquer definição científica acabaremos reduzindo o processo em frases como: "Apontei o telescópio a tal hora para tal direção e observei que..." ou "Misturei tais elementos a uma temperatura tal e averiguei que..." Não estou desprezando a ciência, estou apenas explicando o que ela faz e como ela faz. Seus objetivos são úteis e necessários.

Mas a razão pela qual as coisas existem e se há ou não "alguma coisa" por trás delas não é um problema científico. Se há "algo por trás", este "algo" continuará desconhecido, ou se fará conhecer por outro meio. Afirmar a existência ou não desse ser é algo que a ciência jamais poderá fazer. Os verdadeiros cientistas em geral se abstém de fazer tais afirmações, geralmente esse tipo de especulação é feita por jornalistas ou autores independentes que fazem um apanhado desconexo de fatos científicos e compõem em ordem aleatória as informações de uma ciência mal assimilada. Mesmo se um dia a ciência se tornar perfeita e pudermos conhecer tudo que há no universo continuaríamos sem resposta para perguntas como: "Por que há universo?" ou "Por que ele se mantém?" ou ainda "Qual o sentido da vida?" pois tais questões são referentes ao que há de externo ao universo.São informações inacessíveis do ponto em que estamos.

Tal situação seria desesperadora não fosse o fato de que há uma coisa, e apenas uma em todo o universo, que conhecemos muito além do que conheceríamos através apenas da observação: e essa 'coisa' é o Homem. Nós não só observamos o homem, como nós somos Homens. Por isso temos informações de origem interna, nós SOMOS parte desse conhecimento. E é justamente por isso que sabemos que o Homem possui uma lei moral objetiva não criada por ele mas que atua sobre ele, a qual não é possível se esquecer completamente e a qual devem obedecer.

Percebemos que se alguém estudasse o Homem exteriormente, apenas através de observação, e desconhecesse nossa linguagem (impossibilitando o acesso a informações que só nós poderíamos fornecer), jamais suspeitariam de tal lei, afinal até comprovariam os fatos feitos pelo homem, mas não poderiam adivinhar que apesar do homem agir de uma maneira el saiba que deveria agir de outra. Assim se há algo exterior ao universo jamais poderíamos descobrir através de observações do exterior.

"O problema se coloca então da seguinte maneira: queremos saber se o universo simplesmente é o que é, não tendo razão para existir, ou se há um poder por trás que o faz ser o que é. Esse poder, se existir, não seria nenhum dos fatos observáveis, e sim uma realidade que os produz; por isso ele não poderia ser encontrado mediante a simples observação dos fatos. Num só caso poderemos saber se há ou não algo além: no nosso próprio caso. E neste único caso sabemos que há."

Se há um poder controlador fora do universo ele não poderia se apresentar como um dos fatores de dentro do universo, assim como um arquiteto que projeta uma casa não é uma de suas paredes ou vigas. O único modo que admitiríamos que um poder desses se revele seria na forma de uma influência ou comando, atuando dentro de nós no sentido de procedermos de uma certa maneira. E é justamente isso que constatamos dentro de nós. No único caso que poderíamos esperar uma resposta, a resposta é SIM, e nos outros casos sem resposta, sabemos porque não as obtemos (porque são apenas observadas exteriormente).

É como se você visse uma pessoa uniformizada deixando envelopes na sua casa, você imaginaria que todo o conteúdo que ele carrega dentro dos envelopes são cartaz, mesmo que jamais tenha abrido os envelopes alheios, você conclui isso a partir dos envelopes que foram destinados a você e que sempre têm cartas dentro. Mesmo que o conteúdo das cartas seja diferente, ainda assim é óbvio que em todas elas há um remetente. Não sabemos o que o remetente diz as demais coisas que nos cercam, mas ao ser humano ele fala a respeito de sua lei moral.

Não pense que estou avançando rápido demais, ainda estou longe de apresentar tal força como o Deus do Cristianismo, mas definimos com clareza e lógica que há uma Lei objetiva que não foi feita pelos seres humanos, mas para eles, por um remetente que está por trás de todo o universo, chegamos a tal conclusão ao analisarmos nossa própria natureza a partir de informações internas que só temos por sermos seres humanos (o próprio objeto do estudo). Pensamos até aqui que tal "remetente" se assemelhe mais a uma mente do que qualquer outra coisa que conheçamos, porque tudo o mais que conhecemos é matéria, e é difícil de imaginar matéria sem mentes capazes de dar instruções, não é mesmo? Mas não é preciso até a linha de raciocínio atual que seja realmente como uma mente, ou muito menos como uma pessoa. No próximo capítulo tentamos refletir mais sobre esse ponto.

NOTA: para facilitar a compreensão só foram abordados os pontos de vista materialista e religioso, mas existe um terceiro ponto que seria o da força vital, ou da evolução criadora, que defende que as evoluções do mundo que geraram a vida que conhecemos hoje não é fruto do acaso, mas segue propósitos de uma força vital. Mas para isso é preciso se perguntar se tal Força Vital é dotada de espírito ou não. Se a resposta for afirmativa, então não se está falando nada de diferente sobre o conceito religioso. No caso negativo que sentido há em dizer que algo sem espírito conduz ou tem propósitos? O único motivo pelo qual alguém acreditaria em tal ponto de vista é devido a sua comodidade. Pensando assim recebemos todo o conforto emocional a partir da crença na existência de um Deus, mas não nos vinculamos a nenhuma outra consequência desse fato. Se tudo vai bem é legal acreditar que o universo não é uma mera dança mecânica de acasos. Mas se queremos fazer algo "ruim" então este "Deus" jamais nos impediria. A Força Vital é uma espécie de Deus domesticado. Podemos fazê-lo entrar quando quiser, mas não nos incomodará. Tal comodidade é atraente, mas para aqueles que buscam a verdade e não a comodidade, é um caminho facilmente abandonado.